Por Fausto Almeida*
A descarbonização da economia global vai demandar milhares de toneladas de cobre, níquel, zinco, cobalto, ouro, prata e outros metais necessários a baterias, células fotovoltaicas, circuitos eletrônicos, que virão necessariamente de extrações de minérios.
Até 2030, acredita-se que o setor terá de investir ao menos US$ 200 bilhões para viabilizar o aumento de produção dos chamados metais da transição energética, via abertura de novas minas, e também pelo aumento da eficiência das existentes.
Tudo isso ainda precisa acontecer sem que a atividade mineradora piore o já perceptível aquecimento global, dado que, sozinha, ela responde por 7% das emissões de gases de efeito e, dessa forma, tem de necessariamente se descarbonizar.
Cumprir esses dois objetivos não será tarefa fácil, até porque vai demandar a revisão de conceitos centrais da mineração que fizeram parte de seu paradigma nos últimos 100 anos. O mais desafiador deles é a substituição do diesel como combustível de caminhões e maquinário de extração, responsável sozinho por metade de tudo o que a mineração emite.
Atualmente, várias rotas tecnológicas são estudadas para possibilitar a substituição do diesel, como hidrogênio verde, amônia e até o etanol, entre as alternativas. A eletricidade de origem descarbonizada, no entanto, é a opção da maioria das empresas do setor, especialmente as que integram o Conselho Internacional de Mineração e Metais (ICMM), que já verbalizam a meta de neutralizar emissões até 2050 sob os escopos um e dois.
Nessa frente, o progresso é significativo. Os fabricantes de caminhões, por exemplo, já contam com modelos abaixo de 200 toneladas de carga movidos à bateria de até 400 MWh, passíveis de carregamento em até 40 minutos, que permitem estabelecer operações funcionais, sobretudo de mineração subterrânea, nas quais o uso de motores a combustão não só contraindicado, como também fator de risco à saúde de mineiros.
Os fabricantes já possuem caminhões híbridos movidos a diesel e eletricidade na faixa de 200 toneladas, que movem o grosso do minério extraído no mundo. Esses modelos são movidos por motores elétricos com eletricidade fornecida por geradores embarcados, estes, sim, movidos a diesel, mas que podem funcionar totalmente à eletricidade, desde que convertidos para compatibilizar com linhas elétricas aéreas, os chamados trolleys, que há mais de um século movem bondes, ônibus e trens nas grandes cidades do mundo. Nessa configuração, o diesel só é usado quando a eletricidade falta ou falha.
Em pelo menos dois locais do mundo essa tecnologia de redução de emissões é usada com muito sucesso. Tratam-se de duas minerações de cobre, no Canadá e na Suécia, em que trolleys e caminhões híbridos movem minério do ponto de extração ao de beneficiamento por até um quilômetro. As emissões dessas linhas, no par diesel-eletricidade, recuaram 90% comparadas a um processo que utilizaria de caminhões a combustão. Além disso, a produtividade também se mostrou superior, já que os caminhões híbridos sob os trolleys foram capazes de atingir velocidades médias de 14 km/h, o dobro dos modelos a diesel.
Nessas minerações, no entanto, há dois fatores cruciais que determinam o sucesso da tecnologia. Há energia elétrica limpa gerada ou gerada pelas próprias mineradoras ou facilmente acessível da rede. A geologia do solo também permitiu a instalação dos trolleys e dos demais sistemas de gerenciamento elétrico necessários a seu funcionamento, condição rara no mundo e razão pela qual a mineradora Vale, por exemplo, decidiu apostar em outras rotas tecnológicas que não a eletricidade.
Mesmo assim, a pesquisa nessa rota avança rápido, buscando, além dos trolleys, a viabilização de baterias como fonte de energia de veículos, por exemplo, caminhões na faixa de, pelo menos, 200 toneladas de carga. A americana Caterpillar e a alemã Liebbher, dois dos principais fornecedores de equipamento pesado para mineração, já anunciaram estar testando protótipos de baterias para caminhões seus de 260 e 245 toneladas.
As pesquisas também buscam acelerar o processo de carga de baterias, tornando-o similar ao abastecimento de um tanque de diesel. Nesse ponto, uma força tarefa encabeçada pela CharIN, entidade que reúne empresas do ecossistema de mobilidade elétrica, pelas mineradoras do ICMM já está trabalhando em sistemas que permitam carregar baterias de 400 MWh em menos de 40 minutos.
Há notícias de que algumas empresas da CharIN também estejam estudando a aplicação de inteligências artificiais para determinar o melhor momento de recarregar e de parar o carregamento de baterias, considerando contingências em tempo real de toda a operação, para otimizar o processo de movimentação de minério, inclusive o investimento em maquinário e gasto energético.
Na mesma organização, pelo menos uma empresa estuda o uso dos trolleys como estratégia de carregamento contínuo de veículos, ou seja, como se fossem celulares plugados na tomada, para diminuir ao máximo o tempo de inatividade do equipamento para recarga de energia e ampliando no mais possível sua disponibilidade.
Em resumo, esse é o caminho que a descarbonização da mineração percorreu em sua jornada no que diz respeito à eletrificação. Para que a descarbonização se concretize, uma combinação de tecnologias ainda terá de ser desenvolvida, e hoje é impossível prever qual delas se tornará a mais prevalente.
Uma coisa é dada como certa. A descarbonização vai acontecer. Não só porque a sustentabilidade se impõe como demanda social, mas porque a maior parte das minerações já fizeram a opção em ter autonomia sobre seus insumos energéticos, condição que levará todo o setor a buscar formas de se descarbonizar.
*Diretor de negócios de mineração da ABB, empresa com origem na Suíça, especializada em automação industrial e eletrificação.
Fonte: a4&holofote comunicação
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