Educação ou competição? Nova pesquisa evidencia os problemas da gamificação de plataformas educativas
Elementos de gamificação em softwares de educação, quando mal-empregados, podem desestimular usuário, em vez de contribuir para o aprendizado. De acordo com pesquisa do Departamento de Informática do CTC/PUC-Rio, pressão por uso recorrente do app e pela obtenção de mais pontos desmotiva alunos
Pesquisa do Departamento de Informática do Centro Técnico Científico da PUC-Rio (CTC/PUC-Rio), intitulada “Efeitos negativos da gamificação em software educacional: um mapeamento sistemático e percepções de profissionais”, investigou os problemas da inserção de elementos de gamificação em plataformas digitais voltadas para a educação. O estudo é fruto da interseção entre os laboratórios do Departamento de Informática (DI) do CTC/PUC-Rio: o Software Science Lab, coordenado pelo Prof. Marcos Kalinowski, e o ICAD/IGames/VisionLab, coordenado pelo Prof. Bruno Feijó, um dos principais responsáveis pelo estabelecimento da pesquisa na área de jogos no país. A publicação faz parte da dissertação de mestrado de Cláuvin Almeida e contou com a colaboração de Anderson Uchôa, ex-aluno de doutorado do DI. O artigo foi aceito e publicado no periódico científico internacional Information and Software Technology Journal, de classificação A1 no Qualis (a mais elevada no Brasil).
Conforme a pesquisa, aplicativos educacionais, como o Duolingo, inserem elementos de gamificação para tornar a experiência de ensino mais atrativa. Entretanto, no lugar de transformar o aprendizado, o estudo percebeu que elementos de game design como rankings, quizzes e troféus, quando mal-empregados, podem ser contra produtivos e contribuir para a desmotivação do aluno diante do conteúdo estudado. A gamificação (ou gamification) é o ofício de usar aspectos lúdicos e de engajamento, normalmente usados em jogos eletrônicos, aplicados a atividades produtivas. Na busca por novos métodos de fidelizar os usuários, as plataformas digitais cada vez mais utilizam da estratégia para manter os indivíduos mais dependentes dos serviços digitais. Segundo dados da Orbis Research, é estimado que o setor de gamificação cresça em até 30% até o ano de 2025.
Para a composição do artigo, os autores realizaram um mapeamento sistemático de mais de 80 pesquisas acadêmicas que evidenciavam os efeitos prejudiciais da
gamificação para o processo de educação. A publicação constatou que sensações como ansiedade e desinteresse podem ser resultado de componentes do game design mal-empregados, e que muitos dos desenvolvedores dos softwares desconhecem os impactos humanos da utilização desses elementos digitais.
Segundo o Prof. Marcos Kalinowski, o principal problema dessas plataformas é que elas são projetadas sem a supervisão pedagógica de profissionais de educação. De acordo com o pesquisador, o aprendizado é comumente deixado de lado na procura por maior engajamento. “O aspecto pedagógico desses recursos digitais tem que ser preservado. Uma gamificação eficaz deve ser projetada com conhecimentos sobre a psicologia humana, pois a técnica afeta o comportamento do usuário a partir do momento em que ele faz uso do software”, afirma.
A pesquisa identificou que a presença de rankings pela pontuação dos usuários pode trazer desmotivação do aluno para com o aprendizado. A informação constante de outros indivíduos com pontuações muito superiores geraria uma pressão excessiva sobre o usuário, que, por não ter a mesma disposição em termos de tempo e dedicação, pode preferir abandonar o aprendizado no lugar de se sentir mais estimulado. Já o uso dos Badges (espécie de troféus de recompensa), por exemplo, incentivaria os usuários a trapacearem ao longo de sua trajetória de aprendizado. A busca por atalhos na plataforma digital dá ao indivíduo o prêmio e maiores pontuações. Ele fica satisfeito, mas não tem a aquisição eficiente do conteúdo estudado.
Kalinowski ressalta que a etapa de conversas com os desenvolvedores revelou que muitos dos profissionais não estavam cientes das consequências da aplicação de elementos de gamificação em soluções de software. De acordo com o pesquisador, os entrevistados consideraram os resultados da pesquisa úteis para que os efeitos negativos da gamificação sejam minimizados, de modo que a técnica possa ser usada somente em favor da educação do usuário. “A gamificação pode transformar um conteúdo denso em algo de fácil absorção. Ler uma apostila longa sobre determinado assunto pode ser desanimador para muitos estudantes, mas a gamificação, quando usada da maneira correta, diversifica o processo aprendizagem em favor de uma experiência de estudo mais agradável”, destaca Kalinowski.
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